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PROCESSO:
0001237-94.2010.5.04.0030 -
RO
IDENTIFICAÇÃO
DESEMBARGADOR
LUIZ ALBERTO DE VARGAS
Órgão
Julgador: 3ª Turma
Recorrente: FORJAS TAURUS S.A. - Adv. Beatriz Santos Gomes, Adv.
Rosana Akie Takeda
Recorrido: xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
- Adv. Airton Tadeu Forbrig
Origem: 30ª Vara do Trabalho de Porto Alegre
Prolator
da
Sentença: JUÍZA FABIOLA SCHIVITZ DORNELLES MACHADO
EMENTA
RECURSO
ORDINÁRIO DA RECLAMADA. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. A
atividade desenvolvida pelo empregado, por sua natureza, deve ser enquadrada no
rol de atividades de risco, pelo grau de probabilidade de provocar dano,
atraindo, na hipótese de dano, a responsabilidade objetiva, sendo, portanto,
devida a indenização independente de culpa, com fulcro no artigo 927, parágrafo
único, do Código Civil. Provimento negado.
ACÓRDÃO
por
unanimidade, negar provimento ao recurso ordinário da reclamada.
RELATÓRIO
Recorre
ordinariamente a reclamada às fls. 461/476, inconformada com a sentença das
fls. 447/459 que a condenou ao pagamento de indenização por danos morais,
honorários periciais e assistenciais.
O
reclamante apresenta contrarrazões às fls. 481/484.
VOTO
RELATOR
DESEMBARGADOR
LUIZ ALBERTO DE VARGAS:
INDENIZAÇÃO
POR DANOS MORAIS.
Inconforma-se a
reclamada com a sentença que a condenou ao pagamento de indenização por danos
morais ao reclamante, sustentando a inexistência dos requisitos ensejadores de responsabilidade civil, quais sejam, dano,
dolo ou culpa e nexo causal. Tece comentários sobre a
responsabilidade subjetiva, que entende ser aplicável aos casos de doença
ocupacional e acidente de trabalho. Alega que o autor foi admitido em 27/11/06,
na função de polidor, trabalhando até 03/08/10, data da rescisão contratual,
quando estava apto para demissão, conforme exame médico periódico em 24/06/10.
Afirma que o autor não apresentou incapacidade laborativa
e não esteve afastado em gozo de benefício previdenciário, e o laudo pericial
médico concluiu pela inexistência de nexo causal entre as queixas do reclamante
e suas funções laborais. Aduz que na CAT emitida em 13/08/10, após o
desligamento do autor, pelo sindicato de classe, constou
como origem da moléstia as atividades de polimento e lixamento,
e como agentes causadores a repetitividade, força e
postura, porém, tais informações foram fornecidas unilateralmente pelo autor e
não restaram comprovadas pelo laudo médico pericial. Diz que a doença do
reclamante não decorre de seu trabalho na empresa, que o autor jamais sofreu
acidente do trabalho ou doença ocupacionais, não havendo dano
a ser reparado. Acrescenta que não há falar, tampouco, em qualquer
conduta ilícita, que deve ser comprovada em caso de responsabilidade subjetiva.
Caso mantida a condenação no tópico, entende deva ser limitada ao dano que o
reclamante comprove ter sofrido, e seja reconhecida a culpa concorrente do
autor, com a consequente redução do valor arbitrado a título de indenização.
Entendeu
a sentença, às fls. 449/454, que embora o perito negue a existência de nexo de
causalidade entre a moléstia da qual foi portador o autor e as atividades que
desenvolvia na requerida, não podem ser olvidados os outros elementos de prova
constantes dos autos, até porque o Julgador não está adstrito à prova pericial,
conforme preceitua o art. 436 do CPC. Os documentos das fls. 20/21, datados de
06/08/2010, revelam que o requerente foi acometido por bursite subacromiodeltóidea, sinais de tendinose
do supra espinhoso, epicondilite
lateral, entre outras. Salienta, ainda, que o sindicato emitiu CAT em
13/08/2010, consignando como descrição da situação geradora da doença,
polimento/lixamento dos carregadores de armas - 1 MIL - 1 MIL e 500 peças por dia e como agente causador, repetitividade/força/postura forçada. Assim, embora o
perito não tenha constatado a existência de moléstia incapacitante atual, resta
evidenciado que o autor foi portador de doença durante o contrato. Por outro
lado, o Perfil Profissiográfico Previdenciário,
acostado às fls. 111/113, demonstra a execução de movimentos repetitivos para o
desempenho das atividades do autor (como por exemplo, o polimento manual de
peças de produtos). Por conseguinte, sopesando as provas produzidas é possível
reconhecer que o labor prestado em prol da requerida foi fator contributivo no
desencadeamento ou agravamento das moléstias. Deve, contudo, ser considerado o
caráter genético-hereditário e degenerativo das doenças apresentadas à época
pelo autor, fatores que também devem ser considerados para fins de atribuição
de responsabilidade pelo seu desencadeamento. Porém, o fato de outras causas
terem contribuído para o surgimento-agravamento das lesões, não afasta o dever
de indenizar, uma vez que as moléstias desenvolvidas são multifatoriais, pois
além do labor em prol da requerida, têm origem também em outras causas, as
quais devem ser sopesadas. Sinala que era da requerida o ônus de demonstrar a
sua preocupação com a observância às normas de proteção e segurança do
trabalho, além de fiscalizar e punir o descumprimento das normas relativas aos
usos de equipamentos de proteção, do qual não se desincumbiu a contento,
porquanto não acostou aos autos Programa de Prevenção de Riscos Ambientais
(PPRA), tampouco Análise Ergonômica das Condições de Trabalho, tendo juntado,
apenas, Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) referente ao
ano de 2009 e Programa de Ginástica Laboral referente ao ano de 2006 (fls.
119/219). Não basta, contudo, a empresa acostar tais programas, se não há prova
que na prática se utiliza de tudo o que neles está recomendado. Ademais, tais
programas não são contemporâneos a todo o período do pacto laboral mantido
entre as partes. Por conseguinte, cotejando a prova produzida e presente o nexo
técnico epidemiológico, é possível concluir pela existência de nexo de
causalidade entre as patologias havidas à época do contrato e as atividades
exercidas pelo autor em prol da requerida, além da responsabilidade desta que
não comprovou ter adotado medidas capazes de evitar os infortúnios. Nesse
diapasão, comprovadas as moléstias e o nexo causal, reconhece a
responsabilidade da demandada, restando evidenciado o dever de indenizar.
Entretanto, levando em consideração as concausas
existentes, e, na ausência de parâmetro técnico em relação ao percentual de
contribuição do trabalho prestado, arbitra a responsabilidade da requerida
pelos eventos danosos em 50%. O dano moral, em decorrência das patologias
que se desenvolveram/agravaram em razão do trabalho
prestado em favor da requerida, deve ser deferido, uma vez que resta evidente o
sofrimento e a angústia provocados pelas moléstias, influenciando não somente a
vida laboral do autor, mas a sua vida social e o convívio familiar, o que
justifica a reparação do dano extrapatrimonial. Fixa o valor da indenização
pelo dano moral em R$ 30.000,00, e levando em conta o grau de responsabilidade
imputado à demandada (50%), a condeno ao pagamento de
R$ 15.000,00, valor que observa aos critérios pedagógico, punitivo e reparador,
balizadores da reparação do dano moral, instigando a requerida a tomar as
devidas e necessárias precauções no intuito de diminuir a possibilidade de
ocorrência de doenças ocupacionais a atingir a coletividade dos seus
empregados.
Examina-se.
Considerando
que a rescisão do contrato de trabalho do autor com a reclamada se deu em
03/08/10, as enfermidades constatadas pela ecografia cujo laudo foi juntado à
fl. 20, em exame médico datado de 06/08/10, seriam compatíveis com a contratualidade mantida entre as partes desde junho/06. Já
o laudo pericial médico das fls. 413/420, complementado à fl. 436, concluiu que
as lesões do laudo juntado à fl. 20 são achados de ecografia,
não caracterizando uma doença, uma vez que podem ser achados casuais, não
comparados com o outro lado e sem correspondência com os dados do exame
clínico, não sendo possível atribuir estes achados ao trabalho ou que possam
ter sido agravados pelo labor. Referido laudo foi devidamente impugnado pelo
reclamante. Por outro lado, a CAT emitida em 13/08/10, juntada às fls. 23/24,
descreve como situação geradora da doença o polimento/lixamento
dos carregadores de armas, de 1.000 a 1.500 peças por dia, e como agente
causador, a repetitividade, força e postura forçada,
deixando demonstrado, portanto, que embora o perito não tenha constatado a
existência de moléstia incapacitante por ocasião da perícia médica, o autor foi
portador de doença durante o contrato. Não se pode desconsiderar o laudo
ecográfico da fl. 20, como concluiu o perito médico, diante do restante da
documentação juntada aos autos, mormente quando o perfil profissiográfico
previdenciário do autor, à fl. 111, comprova que entre as atividades realizadas
pelo autor durante a contratualidade constavam as
atividades de polir manualmente peças de produtos.
Assim
sendo, entende-se correta a decisão de primeiro grau enquanto entendeu pela
existência de nexo causal entre as atividades do autor e a doença ocupacional
comprovada documentalmente. Embora o laudo pericial médico negue a existência
da enfermidade, entende-se que a prova documental produzida se sobrepõe às
conclusões do perito médico, devendo ser considerada, enquanto demonstra que as atividades exercidas pelo autor na reclamada, no polimento das
peças, é prejudicial e capaz de acarretar a doença ocupacional alegada na
inicial. A atividade desenvolvida pelo autor na reclamada, por sua natureza,
deve ser enquadrada no rol de atividades de risco, pelo grau de probabilidade
de provocar dano a outrem, atraindo, na hipótese de dano, a responsabilidade
objetiva, sendo, portanto, devida a indenização independente de culpa, com
fulcro no artigo 927, parágrafo único, do Código Civil: "Haverá obrigação
de indenizar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em
lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano
implicar, por sua natureza, riscos para os direitos de outrem." A
indenização não decorre da ação ou omissão para gerar o direito, porque ele
advém tão somente do exercício da atividade de risco. No caso do Direito do
Trabalho deve ser observado, em especial, a teoria do risco
profissional que decorre da atividade desenvolvida pela vítima. O
Direito Laboral nasceu dos conflitos entre capital e trabalho, criando-se uma
desigualdade jurídica inclinada para a proteção do operário, mais fraco
economicamente. Assim, as normas protetivas
constituem um sistema legal em favor do hipossuficiente, de forma que as
vantagens contidas em uma determinada norma, independentemente de sua
hierarquia, não exclui outra vantagem prevista em outra norma, mas tão somente
a complementa. Trata-se do princípio protetivo do
qual deriva o princípio da norma mais favorável, razão pela qual tem-se que, embora a norma constitucional disponha sobre a
responsabilidade subjetiva da empresa, deve ser aplicada também a norma
infraconstitucional mais favorável, ainda que de menor hierarquia. A propósito
cabe citar os comentários de Sebastião Geraldo de Oliveira sobre a corrente
doutrinária que defende a aplicação do artigo 927, parágrafo único, do Código
Civil, em matéria de acidente de trabalho: "A segunda corrente assevera
que o novo dispositivo tem inteira aplicação no caso do acidente do trabalho.
Entendemos que a previsão do inciso XXVIII mencionado deve ser interpretado em harmonia com o que estabelece o caput do artigo respectivo,
que prevê: 'São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de
outros que visem à melhoria da sua condição social'. Assim, o rol de direitos
mencionados no art. 7º da Constituição não impede que a lei ordinária amplie os
existentes ou acrescente 'outros que visem a melhoria da condição do
trabalhador'. Como leciona Arnaldo Süssekind, o
elenco de direitos relacionados no art. 7º é meramente exemplificativo,
admitindo complementação." - (Oliveira, Sebastião Geraldo de, Indenizações
por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional, 2005, LTr.,
p. 91). No mesmo sentido também se posiciona Maurício Godinho
Delgado: "Com os avanços produzidos pela Carta Magna, a reflexão jurídica
tem manifestado esforços dirigidos a certa objetivação da responsabilidade
empresarial por danos acidentários. Tal tendência à objetivação, evidentemente,
não ocorre no campo dos danos morais e à imagem que não tenha relação com a
infortunística do trabalho. De fato, essencialmente na seara da infortunística
é que as atividades laborativas e o próprio ambiente
de trabalho tendem a criar para o obreiro, regra geral, risco de lesões mais acentuado do que o percebido na generalidade de
situações normalmente vivenciadas pelos indivíduos na sociedade." -
(Delgado, Maurício Godinho, Curso de Direito do
Trabalho, 2004, LTr, 3ª Edição, p. 619). Tal
interpretação está em consonância com os princípios fundamentais da própria
Constituição Federal - dignidade da pessoa humana. Nesse sentido também já se
manifesta a jurisprudência, conforme segue: "ACIDENTE DE TRABALHO. TEORIA
DO RISCO DA ATIVIDADE. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. A culpa do empregador,
no caso de acidente de trabalho, decorre da aplicação da teoria do risco da
atividade, que prevê a responsabilidade civil objetiva como forma de obrigação
de garantia no desempenho de atividade econômica empresarial, dissociada de um
comportamento culposo ou doloso. A teoria do risco da atividade parte do
pressuposto de que quem obtém bônus arca também com o ônus. O parágrafo único
do art. 927 do CC/02 recepcionou tal teoria em nossa legislação." (Relator
José Felipe Ledur, processo nº
02414-2005-000-04-00-4, publicado em 19.01.06).
Quanto à
pretensão do recorrente, no sentido de que seja reconhecida a culpa concorrente
do autor, sem objeto o apelo, uma vez que a decisão recorrida já arbitrou a
responsabilidade da requerida pelos eventos danosos em 50%. No que respeita à
limitação ao dano que o reclamante comprove ter sofrido, entende-se que o
argumento, neste sentido, já foi devidamente considerado pelo juízo de primeiro
grau, ao fixar o valor da indenização.
Nega-se
provimento.
HONORÁRIOS
PERICIAIS. HONORÁRIOS ASSISTENCIAIS.
Provido
seu apelo no tocante à indenização por danos morais, pretende a reclamada ser
absolvida da condenação ao pagamento dos respectivos honorários periciais e
assistenciais.
Sem
razão.
Mantida a
sentença em sua integralidade, deve ser mantida também no que se refere aos
honorários periciais e honorários assistenciais, porquanto mantida a
sucumbência da reclamada no feito.
Nega-se
provimento.
lst.