Uma questão de política judiciária no TRT/4a Região.
Advogado em Porto Alegre.
Vice-Presidente do Sindicato dos Advogados do RS
1. O art. 289 do CPC autoriza a dedução de pedidos sucessivos ou subsidiários
na inicial: “é lícito formular mais de um pedido em ordem sucessiva, a fim de
que o juiz conheça do posterior em não podendo acolher o anterior”. Trata-se de
faculdade muito usada no processo do trabalho, onde comumente se requer a
reintegração no emprego ou, não concedida esta, o pagamento dos salários do
período de estabilidade provisória e das parcela rescisórias; o pagamento do
adicional de periculosidade ou, sucessivamente, de insalubridade, etc.
De algum tempo para cá, proliferaram decisões do Eg. Tribunal Regional do
Trabalho da 4a Região que, absolvendo os empregadores da condenação principal,
recusam-se a enfrentar o pedido subsidiário, equívoco lamentável que reclama
pronta reconsideração.
Assim, por exemplo, em determinado processo, a sentença reintegrava o
trabalhador no emprego, tendo sido reformada pelo Regional, que absolveu a
empresa dessa condenação. O reclamante opôs embargos declaratórios por omissão:
cassada a reintegração, queria ver apreciado o pedido sucessivo, de pagamento
das verbas rescisórias não satisfeitas. Os embargos todavia foram rejeitados,
sob o argumento de que não cabia examinar o pedido sucessivo “porque o Autor,
frente ao recurso ordinário interposto pela reclamada, não interpôs recurso
adesivo para se prevenir de possível modificação do julgado que acolheu o
primeiro pedido” (TRT da 4a Região, 2a Turma, Ac. 95.037660-4 ED RO, in DJU
28.04.97 - destaquei).
2. Ora, não se cogita em nosso sistema processual de recurso de quem não
sucumbiu. E se o pedido principal havia sido acolhido, não haveria que se
recorrer do subsidiário, que, face ao acolhimento do principal, restara
obviamente prejudicado. Não está previsto na legislação processual brasileira o
recurso preventivo, como aventado pelo acórdão. Recorre-se de decisões
contrárias às pretensões que se deduziu. Um recurso hipotético, em sã
consciência, não seria conhecido por nenhum Juízo neste País. Ao integralmente
vitorioso falece legitimidade para recorrer, segundo doutrina e jurisprudência
unânimes.
Por outro lado, os dispositivos legais sobre o efeito devolutivo das
apelações lato sensu, como é o caso dos recursos ordinários trabalhistas,
cometem expressamente ao Tribunal a apreciação da causa como um todo, ainda que
a decisão de primeira instância a tenha resolvido por apenas um fundamento:
“Art.515 A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria
impugnada. § 1.º Serão, porém, objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal
todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que a sentença não
as tenha julgado por inteiro. § 2.º Quando o pedido ou a defesa tiver mais de um
fundamento e o juiz acolher apenas um deles, a apelação devolverá ao tribunal o
conhecimento dos demais.” A jurisprudência das Cortes Superiores aponta no mesmo
sentido:
“Se a parte mostrou-se vencedora junto ao Juízo - Junta de Conciliação e
Julgamento - desnecessária e incabível é a interposição de recurso, afim de que
o órgão revisor aprecia matéria de defesa lançada com a contestação. O recurso
ordinário interposto por uma das partes devolve, ao órgão revisor, não apenas o
conhecimento do pedido formulado, mas sim da própria demanda, considerando
aquele e a defesa apresentada pela parte contrária” (TST, E-RR 6.140/83, Rel.
Min. Marco Aurélio, T. Pleno, Ac. 60/87, in Valentin Carrion, Comentários à CLT,
19.ed., São Paulo, 1995, p. 714).
“Por força do efeito devolutivo do Recurso Ordinário, devolve-se ao Tribunal
Regional a possibilidade de apreciar e julgar matéria que participou do debate
prévio indispensável (pedido, defesa e instrução) e, por conseguinte, oferecia
ao órgão de primeiro grau condições plenas de ser dirimida integralmente” (TST,
RR 6.390/90.2, Rel. Min. Manoel de Freitas, 3a Turma, Ac. 244/91, op. cit., loc.
cit.).
“Tratando-se de caso de apelação com impugnação da sentença em seu todo,
impunha-se à Corte de cassação o reexame, não apenas das questões decididas pelo
juízo de primeiro grau, mas também daquelas quem, podendo ter sido apreciadas,
não o foram.” (STJ, 2a Turma, R.Esp. 7.121-SP, Rel. Min. ILMAR GALVÃO, 13.03.91
- DJU 08.04.91, p. 3.871).
Isso também porque o pedido maior contém o menor (no caso, sucessivo),
conforme já decidiu o STF:
“No pedido mais abrangente se inclui o de menor abrangência” (STF, 2a. Turma,
R.Ext. 100.894-6, Rel. Min. MOREIRA ALVES, em 04.11.83, in DJU 10.02.84, p.
1.019, apud THEOTONIO NEGRÃO, CPC e Legislação Processual em Vigor, 28.ed., São
Paulo, Saraiva, 1997, p. 391).
3. Sob o prisma processual, entendo que, se o Tribunal absolver da condenação
principal e não apreciar o pedido sucessivo, as partes devem interpor Embargos
Declaratórios pelo art. 535, II (omissão de ponto sobre que devia pronunciar-se
o tribunal) e violação do art. 515 e §§, todos do CPC. Declarando o órgão
julgador sua negativa de apreciá-lo, pela rejeição dos Embargos, será caso de
Recurso de Revista por violação das literais disposições de lei referidas (art.
515 e §§ e 535, II), afronta à garantia do devido processo legal (CF, art. 5º,
LIV e LV) e negativa jurisdição (art. 5º, XXV), a ser obviado pela alínea “c” do
art. 896 da CLT.
Não se pretende neste modesto e ligeiro trabalho, todavia, oferecer resposta
cabal à questão, mas amplificar o debate para além dos muros privados de cada
processo. Busca-se uma melhor aplicação da lei e, principalmente, lançar um
alerta para os graves danos processuais emergentes dessa política judiciária.
A solução em cada feito, pela demora e o maior congestionamento das pautas
dos tribunais que certamente acarretará, autorizam os advogados trabalhistas
gaúchos a postular coletivamente que os dignos integrantes de sua Corte Regional
porventura associados a tal posição, revisem-na com a máxima urgência.
Porto Alegre/Bento Gonçalves, agosto de 1997.
Pedro Maurício Pita Machado
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