GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS E STF
- O Direito de Greve dos Servidores
Públicos após a decisão do Supremo Tribunal Federal
Ricardo
Carvalho Fraga e Luiz Alberto de Vargas[i]
O ESTADO E A GREVE
A greve sempre foi ponto
de difícil ponderação para a doutrina, pelas amplas conseqüências sociais e
políticas de qualquer movimento paredista. Pelos mesmos motivos,
nenhum Estado desistiu de regular o conflito.[1]
Conforme Norberto Bobbio, “a
partir do momento em que o Estado avocou a solução dos conflitos, ele passou a
dever Justiça”.[2] Para tanto, “o Estado deve
regular o exercício do direito de greve, não no sentido de restringi-lo, mas de
garantir o bem estar comum, e, por outro ângulo, retirar as causas geradoras de
que movimentos dessa natureza são consequência”.[3]
Ao
contrário do que pregavam os teóricos do “absenteísmo” ou da não-participação
do Estado na intermediação dos conflitos coletivos,[4] a intervenção estatal
acentuou-se, a ponto de surgir, a partir dos anos 80, o chamado
“neocorporativismo”, pelo qual se procura dar conta da sobrecarga das
pretensões e das expectativas sociais no circuito político-democrático pela
incapacidade do sistema parlamentar e da administração pública em canalizar o
conflito. Através dele, recorre-se à institucionalização de mecanismos de
conciliação entre o governo, os sindicatos e as associações profissionais.[5] Também como consequência
desta tendência à institucionalização dos conflitos coletivos,[6] a greve, antes considerada um “caso de polícia”, passou, paulatinamente,
a ser encarada
como um “caso de política”, ganhando
reconhecimento como forma legítima
de pressão social dos trabalhadores na busca de solução de conflitos coletivos, bem como instrumento efetivo dos mesmos
em prol da melhoria de sua
situação social.[7]
A greve, assim, é elemento fundamental da luta
dos trabalhadores, configurando-se como manifestação da chamada “autonomia
privada coletiva”, inerente das sociedades democráticas.[8]
Em uma conceituação
clássica, greve "é a suspensão do trabalho levado a cabo concertadamente
por uma coalizão de trabalhadores com o objetivo de lograr
o equilíbrio entre os fatores de produção, logrando-se com ela a aplicação
efetiva de uma justiça social no âmbito dos interesses do capital e do trabalho" [9]
O registro do conceito "clássico"
não pode nos fazer esquecer que a realidade ocorre com muito maior
riqueza do que as tentativas de sua análise e previsões. A greve pode
ocorrer, não somente por razões econômicas, mas também por razões
políticas, sociais ou mesmo de solidariedade. Já se conheceu, por exemplo, greve de motoristas na
cidade de Campinas, São Paulo, em que incidente bem diferenciado no momento de
seu encerramento (morte de um trabalhador grevista em lamentável choque com
segurança privada de uma das empresas) levou ao prolongamento da greve por mais
um dia. Por óbvio, o descontentamento somente poderia levar a algum tipo de
protesto, mas este não tinha conexão direta com as reivindicações dos
trabalhadores. Este fato novo, ausência de trabalho no dia posterior ao
encerramento da greve foi levado à
juízo. O voto vencido da Juíza Fany Fajestein é uma obra jurídica a merecer
leitura e respeito[10].
A Constituição
Brasileira é bem clara, ao não limitar a greve no campo das reivindicações
meramente econômicas, mas, ao contrário, deixando unicamente aos próprios
trabalhadores a decisão sobre a oportunidade da greve e os interesses a serem
por ela defendidos (art. 9º, CF).
Fazemos
tais considerações para lembrar que a greve de servidores, talvez, seja algo
novo, não previsto ao início do sistema capitalista. Hoje, com a maior presença do Estado e um número crescente de servidores públicos, é
fenômeno que não pode ser desprezado. A superação da idéia liberal do “Estado gendarme”
levou a que este assumisse, cada vez mais, atividades outrora reservadas para a
iniciativa privada, ao mesmo tempo em que, paralelamente, também a iniciativa
privada desenvolvesse “serviços de alto interesse e essencialidade” o que levou
à uma “considerável aproximação do setor público à situação do setor privado”,
de modo que “a distinção em quanto ao exercício do direito de greve já não pode
passar, lisa e rasamente, pela linha divisória entre um e outro”.[11] Exige um tratamento na doutrina e na legislação. Certamente, tem
peculiariedades diversas da greve "clássica" do empregado contra o
empregador, acima de tudo, porque na outra parte está a sociedade toda. De
qualquer modo, na sua origem, existe a exata mesma situação de um trabalhador
buscando melhores condições de trabalho.
A
SEDIMENTAÇÃO DO CONCEITO DE GREVE
Superando
intermináveis discussões sobre se
a greve é um direito
ou um fato[12], pode-se reconhecer, hoje, a
sedimentação de alguns pontos, sobre os quais se pode
dizer que há, na
doutrina, razoável consenso:
a)
a
greve é um direito coletivo;
Assegurado em praticamente
todas as constituições modernas, está previsto também na Constituição
Brasileira, desde
1946, a greve como um direito dos trabalhadores, ainda que restrito. As Constituições brasileiras anteriores não
tratavam da greve, exceto a de 1937, que a declarava como um recurso
anti-social. Já a Constituiçao de 1988 consagra
amplamente o direito de greve, incluindo-a como um direito social constante do
título dos Direitos e Garantias Fundamentais e, portanto, com aplicação
imediata (Art.5º, parágrafo 1º).
Da mesma
forma, diversos tratados internacionais incorporados ao ordenamento jurídico
brasileiro reconhecem o direito de greve como um direito fundamental dos
trabalhadores[13], em
especial a Convenção n. 151 da OIT (art. 8º) e o Pacto Internacional dos
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (art. 8º, 1, d).
O direito de greve como direito fundamental está
assegurado a todos os trabalhadores, dotando-os, assim, da possibilidade de,
através da luta coletiva, obterem a melhoria das suas condições de vida.
b) a greve é fundamental para o equilíbrio das
relações sociais;
O acolhimento da greve
como um direito dos trabalhadores implica no reconhecimento do Estado de que a
greve é necessária para o equilíbrio das relações sociais, na medida que
representa uma tentativa de contrabalançar a significativa desigualdade das
partes em conflito. Se os empregadores possuem o controle incontrastável dos meios
produtivos (e, assim, também da fonte de manutenção dos empregados), os
trabalhadores nada mais tem do que a possibilidade de coalizão para, de forma
coletiva, exercerem algum tipo de pressão sobre o patrão em apoio às
reivindicações de melhoria das condições de trabalho. A forma de pressão mais
efetiva (senão a única) é a da paralisação coletiva do trabalho, ou seja, a
greve.
Sem o direito de greve, as
reivindicações obreiras tornam-se súplicas e o atendimento das mesmas dependerá
da boa vontade do patronato – e não o resultado do embate social.
De um
ponto de vista econômico, a greve pode ser vista como um instrumento a serviço
da distribuição de renda e de promoção da igualdade na medida em que sirva como
mecanismo de pressão pela repartição da riqueza social.
Cabe a nós perceber que a análise da “vontade” dos
interessados diretos não é a mesma compreendida pelo Direito Civil. Esse
outro se propunha mais exatamente a superar a ordem medieval, na qual
pouco ou nada podia pretender/desejar quem não fosse nobre. Estamos muito mais
além no tempo e em outra área do conhecimento do Direito.
Hector-Hugo Barbaagelata, autor contemporâneo
de Américo Plá Rodrigues acompanhou os debates sobre os princípios do Direito
do Trabalho desde os primeiros escritos de seu colega ilustre e recentemente
falecido.[14] O autor aponta que,
na França, o que se denomina “particularismo” (na Itália, “peculiariedades”) ,
no Brasil, provavelmente, seja o conceito mais amplo de “autonomia do Direito
do Trabalho”. Todos estes avanços da humanidade receberam significativas
“mutilações” nas últimas décadas do século passado. Exige-se, pois, examinar
novamente o nascimento do Direito do Trabalho.
O Direito do Trabalho nasceu para liberar
as forças da autonomia coletiva, nas palavras por nós traduzidas, do autor em exame.
Ora, “liberar as forças da autonomia coletiva” é algo muitíssimo distinto de
outra expressão, mais frequentemente divulgada entre nós, de “autonomia da vontade”, seja individual ou
coletiva. Este segundo conceito deriva do Direito Civil.
No Direito Civil o reconhecimento de
que todos tem “vontade” foi relevante para se ultrapassar as amarras dos
sistemas medievais, nos quais apenas o senhor feudal detinha poderes e
“vontade”. Pretende-se que todos participem da sociedade,
viabilizando a circulação de riqueza. Nesta
nossa nova disciplina, o Direito do Trabalho, a “vontade”, desejo
e aspiração maior é a busca da sobrevivência do trabalhador e, em determinados
momentos excepcionais a busca de melhores condições de trabalho. Não se trata de acolher a “autonomia da vontade”
com menor intensidade, mas, sim, compreender que são conceitos diversos, com
finalidades bem distintas.
c)
a
greve é um dos elementos essenciais à democracia;
Não pode um Estado se
pretender democrático quando, na prática, imobiliza ou amordaça uma parte
significativa da população (os trabalhadores), condenando-os a se conformarem
com as suas atuais condições de trabalho, retirando-lhe o único instrumento de
luta que possuem.
Em outro momento, lembramos que a construção de sua dignidade também é preocupação, com
prioridade acentuada, do
Direito do Trabalho. Aí, sim, neste momento
mais atual, ganha relevo a proximidade com o Direito Constitucional e também
com o Direito Civil, agora igualmente já "constitucionalizado".
A
Organização Internacional do Trabalho (OIT), em múltiplas ocasiões, em especial
na sua Conferência de 1970, tem enfatizado os vínculos profundos entre as
liberdades sindicais e as liberdades civis, ressaltando que “o sistema
democrático é essencial para o exercício dos direitos sindicais”.[15] Por outro lado, desde o
pós-guerra, a liberdade sindical e o direito de greve foram consagrados como
direitos humanos fundamentais e assim tem se mantido, mesmo diante das mais
agudas crises políticas e econômicas, e vinculando-se, dessa maneira, à
democracia.[16]
d) em
relação ao resultado da greve , o Estado deve ser neutro;
Desde que evoluiu
para fato neutro para o Direito para, por fim, ser direito assegurado ao
cidadão e merecedor de regulação pública. porém o
resultado mesmo do conflito deve ser indiferente ou neutro para o Estado e,
assim, este deve se abster de favorecer qualquer das partes e, por isso,
influenciar no resultado do conflito, que deve expressar a livre competição das
partes. Assim não cabe ao Estado incentivar, fomentar , reprimir
ou coibir o conflito, de forma a afetar seu resultado. Bem entendido deve o Estado assegurar a
equidade das partes envolvidas. [17]
Assim, a greve, mais do que nunca, deve ser encarada
como instrumento imprescindível da negociação coletiva e como direito
constitucionalmente assegurado aos trabalhadores. Se, a pretexto de resolver o
conflito coletivo, muitas vezes tolerou-se, no passado, que o Judiciário
interviesse abruptamente, pondo fim a movimentos grevistas, hoje, tal
intervenção é totalmente descabida, ante a clara intenção do legislador
constitucional de desautorizar a atuação do Estado nos conflitos coletivos,
exceto pela vontade expressa e conjunta dos atores sociais envolvidos ou na
hipótese excepcional prevista na própria norma constitucional, em que
possa haver lesão ao interesse público.[18]
Exemplo
negativo de uma postura neutra em relação ao conflito pode ser constatado na
atuação do TST na greve dos petroleiros, em 1995, onde, sob o argumento de
impedir o desabastecimento de gasolina e óleo diesel e garantir o “Estado de
direito”, foi decretada a ilegalidade da greve, determinando-se o retorno
imediato ao trabalho. Foram fixadas multas excessivas foram cominadas aos
sindicatos de trabalhadores, demissões de grevistas foram feitas e autorizada a
substituição dos grevistas. Claramente, o Estado, através do TST, colocou-se contra
as reivindicações obreiras e empenhou-se em pôr fim ao movimento paredista. [19] A
atuação do TST no episódio foi condenada pelo Comitê de Liberdade Sindical da
OIT, que pediu a reintegração imediata dos trabalhadores demitidos na
paralisação.
e)
também por isso, compete ao Estado manter um ambiente
favorável à negociação coletiva, favorecer o
diálogo entre as partes e, com o consentimento geral, servir como mediador ou,
em casos excepcionais, como árbitro.
A OIT, em
sua “Declaração sobre os princípios e direitos fundamentais no trabalho”,
considera que o “reconhecimento efetivo do direito à negociação coletiva” é um
compromisso de todo Estado-membro, ainda que não tenha ratificado qualquer
convenção, compromisso esse derivado do fato de pertencer à Organização, de
respeitar, promover e tornar realidade, de boa fé e de conformidade com a
Constituição, os princípios relativos aos direitos fundamentais que são objeto
dessas convenções.
Pela
Convenção n. 98, IV, tem o Estado o dever de adotar medidas adequadas às
condições nacionais para estimular e fomentar o pleno desenvolvimento e o uso
de procedimentos de negociação coletiva voluntária, com o objetivo de regular,
por meio de convenções coletivas, as condições de emprego.
Já a
Convenção n.154 estabelece que a
negociação coletiva deva ser possibilitada a todos os empregados e a todas as
categorias de trabalhadores, de todos os ramos de atividade, inclusive aos
trabalhadores da Administração Pública, ressalvado, quanto a estes, que a
aplicação das normas possa atender formas diferenciadas que atendam as
peculiaridades da legislação ou das práticas nacionais. Especificamente em
relação aos servidores públicos, a Convenção n. 151, 7º prevê que “deverão ser
adotadas medidas adequadas às condições
nacionais para estimular e fomentar as autoridades competentes e as
organizações de empregados públicos acerca das condições de emprego ou de
quaisquer outros métodos que permitam aos representantes dos empregados
públicos participar na determinação de tais condições”.
Finalmente,
o Comitê de Liberdade Sindical da
OIT considera o direito à
negociação coletiva um componente essencial à liberdade sindical.
f) compete, porém, ao
Estado garantir o direito de terceiros, de modo que não sejam prejudicados ou,
na impossibilidade disso, que o prejuízo seja o menor possível;
Quanto aos efeitos sobre
terceiros, o Estado não pode nem deve ser neutro. Tampouco pode ser neutro o Estado
quanto ao efeito na sociedade do prolongamento da greve. Assim, o estado tem o
dever de fomentar a negociação coletiva e, mesmo, empenhar-se para que, sem
interferir no resultado da greve, aproximar as partes de um acordo, de modo que
a duração da greve seja a menor possível, reduzindo
os prejuízos para todos os envolvidos e para a própria sociedade.
O dever
de atuação do Estado na preservação do direito de terceiros se fundamenta não
apenas na cláusula geral de proteção dos direitos do cidadão, mas,
particularmente, porque aqui estamos em um dos raros casos em que o Estado
assegura ao particular a autotutela de seus interesses.[20]
No
entanto, a atuaçao do Estado deve ser proporcional e há de se ter em conta não
mera inconveniência, eis que inevitável algum grau de transtorno, por estarmos
em sociedade com trabalhadores não satisfeitos.
g)
em
relação aos serviços essenciais à coletividade, deve o Estado garantir a
continuidade na prestação dos mesmos;
Como
pondera Oscar Ermida Uriarte, “en todo sistema de solución de conflictos del
trabajo en los servicios esenciales, el problema fundamental radica en que
forzosamente su finalidad es evitar una interrupción prolongada – y en algunos
casos cualquier interrupción – de
ciertas actividades”, lo que inevitablemente implica la introducción de algún
límite al ejercicio del derecho de huelga: “se trata, pues, de establecer un
equilibrio entre el interés general y los derechos de las partes en conflicto”.[21]
Conforme a OIT, por sua
Comissão de Peritos na aplicação de Convênios e Recomendações, “a proibição
deveria limitar-se aos funcionários que atuam na qualidade de órgãos dos
poderes públicos ou em serviços cuja interrupção poderia pôr em perigo a vida,
a segurança ou a saúde das pessoas de toda ou parte da população” Assim, este
órgão internacional tem desqualificado como “serviços essenciais” a rádio e
televisão, os setores de petróleo, os portos, os bancos, os serviços de
informática para arrecadação de taxas e impostos, os grandes supermercados e os
parques de diversão, a metalurgia e o conjunto do setor mineiro, os transportes
em geral, os pilotes de aeronaves, a geração transporte e distribuição de
combustíveis, os serviços ferroviários, os transportes metropolitanos, os
serviços de correios, o serviço de recolhimento de lixo, as empresas
frigoríficas, os serviços de hotelaria, a construção, a fabricação de
automóveis, as atividades agrícolas, o abastecimento e a distribuição de
produtos alimentícios, a “Casa da Moeda”, a “Agência Gráfica do Estado”, o
setor de educação, empresas de engarrafamento.[22]
Em todo caso, a OIT prevê uma
“salvaguarda” (ou uma “extensão” do conceito de “serviço essencial”) para
situações em que a greve, por sua extensão ou duração, possa provocar “uma
situação de crise nacional aguda, tal que as condições normais de existência da
população possam estar em perigo” ou em “serviços públicos de importância
transcendental”. Nesses casos, se
considera legítima a exigência de que se mantenha um “serviço mínimo de
funcionamento” ainda que em setores que, “a priori”, não seriam essenciais. Por
outro lado, na própria definição de quais seriam esses serviços mínimos
deveriam participar as organizações sindicais, junto com os empregadores e as
autoridades públicas. De toda sorte, insiste a OIT que esses serviços mínimos
“deveriam limitar-se às operações estritamente necessárias para não comprometer
a vida ou as condições normais de existência de toda ou parte da população” e
devem ser determinadas “de forma clara, aplicadas estritamente e de
conhecimento, em seu devido tempo, pelos interessados”.[23]
Esses
consensos são relativizados quando se trata de serviço público, em parte
preconceitos outra parte reais dificuldades de transposição das regras pensadas
a principio no âmbito do serviço privado.
A GREVE E OS SERVIDORES PÚBLICOS
As controvérsias sobre o
direito dos servidores públicos à greve se situam num patamar ainda anterior,
qual seja, se os servidores públicos são trabalhadores – e, assim, a relação
com seu tomador de serviços (o Estado) é uma relação bilateral ou, ao
contrário, estamos diante de uma relação unilateral em que, em nome do
interesse público, o Estado impõe as condições de trabalho sem espaço para a
negociação contratual.[24] Para a maioria dos
autores, a bilateralidade foi introduzida pela Constituição de 1988, que, a par
dos princípios anteriores de direito administrativo (moralidade, legalidade,
etc.), incorporou princípios novos, dentre os quais o mais importante, "o
da bilateralidade do vínculo funcional, verdadeira contrariedade para os
administrativistas clássicos".[25]
No campo
do direito do trabalho, na esteira de uma cada vez mais presente participação
do Estado em atividades antes restritas ao setor privado, assistimos a uma
verdadeira “celetização” de relações antes marcadas pelo regime estatutário.
Passaram a fazer pouco sentido as doutrinas que negavam ao servidor público
direitos de natureza contratual.[26]
Superando uma noção muito restrita de "interesse público", na esteira das modernas
Constituições, a Carta
Magna brasileira reconhece que o
interesse público se encontra também na base dos direitos fundamentais dos
trabalhadores, entre os quais estão o direito de sindicalização e o direito de
greve.[27] De
tal direito, não se exclui os servidores públicos, na medida que o art. 9º da Constituição
Federal assegura o direito de greve a todos os trabalhadores, não discriminando
os servidores públicos. Da mesma forma, não há dúvidas de que os servidores
públicos civis gozam de direito de sindicalização (art. 37, VI, CF) , já que,
quanto ao militares há expressa proibição (art. 42 parágrafo 5º, CF).[28]
Quando da
edição da Lei 8.112/90, que institui o regime único dos servidores públicos
civis, foram previstos, pelo menos, dois pontos importantes, que significavam
um avanço no estabelecimento dos direitos sindicais dos trabalhadores da
Administração Pública: o direito à
negociação coletiva e ao dissídio coletivo (art. 240, alíneas “d” e “e”).
Entretanto, o STF afastou esses avanços através de ADIN 492-1, que, já
liminarmente, entendeu pela inconstitucionalidade da extensão aos servidores
públicos da Administração direta dos
direitos à negociação coletiva e ao ajuizamento de dissídio coletivo, decisão,
posteriormente, confirmada no mérito. [29] O fundamento da decisão
remete à superada teoria da unilateralidade.[30]
Paradoxalmente,
assim, passou a existir uma categoria de trabalhadores a que são reconhecidos
os direitos de sindicalização e de greve, mas que não possuem direito a
negociar coletivamente[31]. Como bem aponta Fernando
Belfort, “os servidores públicos da Administração direta acabaram, na prática,
sendo expurgados, através da interpretação dada pelo Supremo Tribunal Federal,
de seus direitos constitucionais, na medida em que, não podendo exercer o
direito de negociação, os seus sindicatos passaram a atuar exclusivamente como
forma de pressão para a alteração da legislação.[32]
Na mesma
linha de negação dos direitos sindicais dos servidores públicos, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Mandado de Injunção n.
20, apreciando a auto-aplicabilidade do art. 37, VI da Constituição Federal,
decidiu que "o preceito constitucional que reconheceu o direito de greve
ao servidor público civil constitui norma de eficácia meramente limitada,
desprovida, em consequência, de auto-aplicabilidade, razão pela qual, para
atuar plenamente, depende da edição de lei complementar exigida pelo próprio
texto da constituição" (MI n. 20, Relator Min. Celso de Mello,DJ de
22/11/96, p.45690).
As oscilações
da doutrina e da jurisprudência sobre o direito de negociação coletiva e de
greve dos servidores públicos não impediram que, no mundo da vida, eclodissem
inúmeras greves de servidores publicos e que, na prática, houvesse negociação
entre os entes públicos e os grevistas, ocorrendo na realidade o que é negado
pelo ordenamento jurídico nacional. Provavelmente, entre as primeiras negociações neste âmbito e após a
Constituição de 1988 tenha ocorrido na cidade de São Paulo, ao tempo da
Prefeita Luiza Erundina.
Os impasses mais
significativos ocorreram, emblematicamente, quanto ao desconto/compensação
do salário relativo aos dias de não-trabalho dos grevistas em decorrências da
paralisação. Buscando enfrentar sucessivas greves no serviço público, o Governo
Federal editou, o Decreto n. 1480/95, o qual, a
pretexto de regular o art. 37, VI da Constituição Federal, proibia o abono, a
compensação e o cômputo para tempo de serviço e para qualquer vantagem das
faltas decorrentes de paralisação de servidor público em movimento de
paralisação de serviços públicos. Tendo por base tal regulamentação, o Poder Executivo
da época procedeu ao desconto dos salários dos grevistas relativamente aos dias
de paralisação, contra o que as entidades sindicais dos servidores públicos
ingressaram em juízo, propondo mandados de segurança que terminaram por
exitosos, suspendendo o descontos salariais. O Judiciário, então, reconheceu a
ilegitimidade dos procedimentos baseados em "ato normativo de baixo
escalão" que não poderia "dispor de forma contrária ao texto magno,
estabelecendo restrições e direitos e impondo sanções"[33] Outras decisões
entenderam pela inaplicabilidade do referido decreto em decorrência da
impossibilidade de "reconhecimento da ilegalidade da greve".[34]
No mesmo processo, em outra
linha argumentativa, entendeu o julgador que não poderia haver descontos
salariais decorrentes de faltas por greve em situações em que a paralisação
ainda não havia terminado e, assim, não cabia ao poder público descontar o
salário dos servidores sem, antes, permitir-lhes o exercício do devido
processo, vulnerando a garantia do art. 5o, LV da Constituição Federal e
resvalando para o "abuso, porque nega aos servidores o devido processo e
sonega-lhes os alimentos, estes imprescindíveis para a manutenção própria e da
família".
Tais decisões evidenciam a
perplexidade gerada pela insegurança jurídica criada pelo vazio legislativo
decorrente da omissão do Legislativo em regulamentar o direito de greve dos
servidores públicos. De um lado, o administrador se via impedido de descontar
os dias de greve e punir grevistas que participassem de greve abusiva - mesmo
porque sequer havia base normativa para declaração da abusividade da greve. Por
outro, os grevistas se viam privado de negociar coletivamente (mesmo os
salários dos dias de paralisação) e, assim, dar consequência ao movimento paredista.
As soluções para os movimento de greve de servidores públicos terminavam,
invariavelmente, em acordos informais e beirando à ilegalidade, onde o
administrador se comprometia em buscar os meios para o atendimento das
reivindicações dos grevistas, enquanto que estes se comprometiam em compensar
os dias de falta decorrentes da paralisação.
Os impasses levaram a
incontáveis manifestações pela urgência quanto à regulamentação do direito de
greve previsto na norma constitucional. [35]
Entretanto, ainda que
vários projetos de lei tenham sido apresentados ao longo dos últimos 19 anos[36], o Congresso Nacional
deixou de editar lei a respeito, seja lei complementar, seja lei ordinária.[37]
O JULGAMENTO DO DIREITO DE GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO
PELO STF
Ante esse verdadeiro
clamor, finalmente, o STF - que já desde 1994 (data do julgamento), por ocasião
da apreciação do Mandado de Injunção n. 20, já havia denunciado a omissão
legislativa em regulamentar o direito de greve, porém sem avançar em colmar a
lacuna legislativa - revisando o posicionamento anterior, decidiu pela
adoção da lei de greve do setor privado como regulamentação das greves do setor
publico (Mandados de Injunção,
números 670, 708 e 712).[38]
Conforme voto condutor do
Ministro Gilmar Ferreira Mendes[39], acolheu-se
a pretensão dos impetrantes no sentido de que, após um prazo de 60 dias para que o Congresso Nacional
legisle sobre a matéria, caso não o faça, determina-se que, solucionando a omissão legislativa, "se aplique a Lei
n. 7.783 de 28 de junho de 1989, no que couber", enquanto a omissão
não seja devidamente regulamentada por Lei específica para os servidores
públicos".
Na mudança drástica da
posição anterior - que meramente sinalizava ao Congresso Nacional a omissão
legislativa, destaca-se a clara preocupação da Corte Constitucional em dar
efetividade a norma fundamental que assegura o direito de greve aos servidores
públicos, dando cobro a inércia abusiva dos poderes constituídos que, por
dezenove anos, frustrou "a eficácia de situaçoes subjetivas de
vantagem reconheidas pelo texto constitucional". Segundo o Ministro Celso
de Mello, "revela-se essencial que se estabeleça, tal como sucede
na espécie, a necessária correlação entre a imposição constitucional
de legislar, de um lado, e o consequente reconhecimento do direito
público subjetivo à legislação, de outro, de forma que, presente a
obrigação jurídico-constitucional de emanar provimentos legislativos, tornar-se-á
possível não só imputar comportamento moroso ao Estado (...) mas, o
que é muito mais importante ainda, pleitear, junto ao Poder Judiciário, que
este dê expressão concreta, que confira efetividade e que faça atuar
a cláusula constitucional tornada inoperante por um incompreensível
estado de inércia governamental".
Não pode haver dúvidas de
que a decisão do STF se dá num contexto de garantia dos direitos subjetivos dos
trabalhadores do serviço público ao exercício do direito de greve assegurado
constitucionalmente, mas até então, negado pela inércia do Legislativo e do
Executivo.[40] É
nesse espírito de extensão à significativa parcela dos trabalhadores dos mesmos
direitos à luta coletiva pacífica já assegurados aos trabalhadores da
iniciativa privada que se deve interpretar a aplicação à greve no serviço
público das normas atinentes à greve do setor privado.
Por outro lado, também
visível ter pesado na decisão do Supremo a urgência de que as paralisações no serviço
público tivessem alguma parâmetro para declaração ou não de sua eventual
abusividade, forma constitucional de restrição do exercício do direito de greve
pelo Poder Judiciário em caso de paralisações que, entre outras formas de abuso
de direito, desatendam o princípio da boa-fé negocial, que terminem por violar
outros direitos fundamentais ou que atinjam seriamente o direito de
terceiros, em especial em serviços essenciais ou em desatendimento de
necessidades inadiáveis da comunidade.[41]
Assim, no entendimento
majoritário do STF, trata-se de construir, para o serviço público, um conceito
de "serviços essenciais" que, mais do que uma repetição do contido na
Lei 7.783/89, assegure o direito da população a "serviços públicos
adequados e prestados de forma contínua", em atendimento ao art. 9o, caput
c/c art. 37, VII da Constituição Federal). Parece claro que a amplitude desse
limitação ao exercício do direito de greve pela reconhecimento da necessidade
de continuidade de determinados serviços públicos será feita, caso
a caso, jurisprudencialmente, na medida em que "de acordo com as
peculiaridades de cada caso concreto e mediante solicitação de órgão
competente, seja facultado ao juízo competente impor a observância a regime de
greve mais severo em razão de tratar-se de serviços ou atividades essenciais
nos termos dos já mencionados arts. 9o e 11 da Lei n. 7.783/89" (voto do
Ministro Gilmar Mendes).
O disciplinamento da greve
em serviços públicos que tenham características afins aos "serviços ou
atividades essenciais" deve ser tão ou mais severo que o dispensado aos
serviços privados ditos "essenciais". Fica claro que, ao contrário do
art. 10 da Lei n. 7.783/89, não se está preso a um arrolamento exaustivo de
"serviços essenciais" ("numerus clausus")[42], mas trata-se de uma
orientação para uma construção pretoriana de uma regulamentação provisória que,
identificando, no caso concreto, a similariedade com as situações
previstas na norma legal (imperativo de atendimento de necessidades inadiáveis
da comunidade que, em caso de não atendimento, coloquem em "perigo
iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população" - Lei
7.783/89, art.11), preserve os interesses maiores da coletividade mesmo que a
custa de alguma restrição ao exercício do direito fundamental de greve.
Estamos, aqui, claramente
ante a possível colisão entre dois valores juridicamente protegidos pela
Constituição Federal, o que exige do intérprete uma lógica distinta da
própria à resolução dos conflitos de normas. Se neste caso, não se admite a
coexistência no mesmo sistema jurídico de duas normas contraditórias entre si,
quando se trata de conflito entre dois princípios constitucionais, não se
aplica a lógica da exclusão. Em tal caso, a regra é exatamente o oposto: a da
coexistência e da harmonia dos princípios colidentes, através do mecanismo da
ponderação. Ou seja, ao invés da eliminação de um dos termos contraditórios,
busca-se o equilíbrio dos contrários, a convivência possível entre dois valores
essenciais ao sistema constitucional, de modo que a harmonização de ambos no
caso concreto seja a reafirmação de ambos, que, ainda que se limitados
reciprocamente em sua eficácia.[43]
Sem dúvida, trata-se de um
difícil equilíbrio, mesmo em face de greves no setor privado e que se torna
ainda mais problemático quando ocorrem greves no setor público.
No voto do Ministro
Joaquim Barbosa, por exemplo, são citados, como exemplos, da insuficiência da
aplicação analógica da Lei 7.783/89 ao setor público, a ausência de regulação
específica quanto à continuidade dos serviços judiciais para garantia do
"habeas corpus" (art. 5o, LXVIII, CG); quanto à continuidade dos
serviços administrativos no que tange ao fornecimento de certidões(art. 5º,
XXXIII, CF); quanto à continuidade dos serviços do setor de saúde, de forma que
não se comprometa o direito de todos à vida (art. 5º.,
caput. CF)[44] e
quanto à continuidade dos processos eleitorais. Certamente, estes são apenas
alguns exemplos de como a greve no serviço público pode, especificamente, ser
causa de violação de direitos fundamentais da população no que se refere à
continuidade de serviços essencais.
Na tentativa de
estabelecer algum balizamento para essa difícil tarefa de ponderaçao de
princípios constitucionais, o voto do Min. Gilmar Mendes
levou em consideração algumas propostas legislativas que tramitam no Congresso
Nacional para estabelecer uma regulamentação provisória para a greve dos
servidores públicos, tomando por base a lei de greve para o setor privado (Lei
7.783/89).[45] Assim, comparando tais
anteprojetos e o texto da Lei n. 7.783/89, o voto do Ministro Gilmar Mendes
ponderou, entre outros aspectos, algumas possibilidades interpretativas na
aplicação analógica da lei de greve ao serviço público:
- a
aplicabilidade integral da norma constitucional quanto a competir aos
servidores públicos, nos termos e nos limites da lei, decidir sobre a
oportunidade de exercer o direito de greve e sobre os interesses que devam por
meio dele defender;
- que a prerrogativa de convocar greve é das
entidades sindicais, em assembléia-geral convocada conforme seus estatutos;
- que,
tratando-se de serviços essenciais, quando da deflagração da greve, o prazo
para comunicação prévia da data de seu início deve ser, pelo menos, de 72
horas;
- tal
como ocorre no setor privado, em caso de greve em serviços considerados
essenciais em que não se observem as garantias estabelecidas em lei, a
Administração poderá proceder à contratação de pessoal por tempo determinado ou
de serviços de terceiros;
- que os
dias de greve sejam de suspensão do contrato de trabalho e, assim, não há falar em pagamento de salários.
Entretanto, tratando-se de matéria a ser decidida no julgamento do dissídio de
greve, caberá ao Tribunal, apreciando a
questão, entender pelo pagamento dos dias de paralisação, [46]
- configuram-se abuso do direito de greve, entre outras
condutas, a recusa à prestação de serviços inadiáveis e a manutenção de greve
após celebrado acordo ou decisão judicial, com as sanções correspondentes.
É de se citar, no voto do
Ministro Marco Aurélio, uma tentativa de criar uma verdadeira "Carta de princípios e regras”, de onde se
extraem, além das normas citadas anteriormente, também as que seguem:
- a
suspensão da prestação dos serviços deve ser temporária, pacífica, podendo ser
total ou parcial;
- a paralisação dos serviços deve ser precedida
de negociação ou tentativa de negociação;
- a
entidade dos servidores públicos representará os interesses dos trabalhadores
nas negociações perante a Administração e o Poder Judiciário;
- são assegurados aos grevistas, dentre outros
direitos, o emprego de meios pacíficos tendentes a persuadir ou aliciar os
servidores a aderirem à greve e a arrecadação de fundos e livre divulgação do
movimento;
- em
nenhuma hipótese, os meios adotados pelos servidores e pela Administração
poderão violar ou constranger os direitos e garantias fundamentais de outrem;
- é
vedado à Administração adotar meios para constranger os servidores ao
comparecimento ao trabalho ou para frustrar a divulgação do movimento;
- as
manifestações e atos de persuasão utilizados pelos grevistas não poderão
impedir o acesso ao trabalho, nem causar ameaça ou dano à propriedade ou
pessoa;
- durante o período de greve, é vedada a
demissão de servidor fundada em fato relacionado à paralisação, salvo em se
tratar de ocupante de cargo em comissão de livre provimento e exoneração;
- é
lícita a demissão ou a exoneração de servidor na ocorrência de abuso do direito
de greve;
- durante
a greve, a entidade representativa dos servidores ou a comissão de negociação,
mediante acordo com a Administração, deverá manter em atividade equipes de
servidores com o propósito de assegurar a prestação de serviços essenciais e
indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da coletividade;
- a
responsabilidade pelos atos praticados durante a greve será apurada, conforme o
caso, nas esferas administrativas, civil e penal.
Por fim, na delicada questão sobre quem deverá julgar
o conflito, o STF adotou “parâmetros institucionais e constitucionais de
definição de competência, provisória e ampliativa, para a apreciação de
dissídios de greve instaurados entre o Poder Público e os servidores com
vínculo estatutário”. Assim, em linhas gerais, pode-se dizer que:
- se a
paralisação ocorrer em âmbito nacional, ou abranger mais de uma região da
Justiça Federal, ou ainda abranger mais de uma unidade da federação, a
competência será do STJ, por aplicação analógica do art. 2º I, “a”, da Lei
7701/88;
- se a
controvérsia estiver adstrita a uma única região da Justiça Federal, a competência
será dos Tribunais Regionais Federais (aplicação analógica do art. 6º, da Lei
n. 7.701/88);
- para os
servidores estatutários estaduais ou municipais, em caso de controvérsia restrita
a uma unidade da Federação, a competência será do respectivo Tribunal de
Justiça (também por aplicação analógica do art. 6º, da Lei 7.701/88).
A PARTIR DA DECISÃO DO STF
Há de se reconhecer o notável esforço do
STF, já que a transposição das normas
relativas ao direito de greve, previstas para os trabalhadores civis do setor
privado, para o âmbito do serviço público não se faz de forma simples. Nesse
sentido, o alerta do Ministro Ricardo
Lewandowski de que "as
consequências e implicações para a sociedade de uma greve de servidores
públicos são distintas daquelas produzidas por uma paralisação de empregados na
área privada", o que, segundo o Ministro, pode e deve "ensejar
tratamento diferenciado".
Porém, a necessária
cautela na adequação do direito aplicável a situações realmente distintas, não
deve paralisar a operação analógica que reconhece que, guardadas as devidas
particuliaridades de cada fenômeno, a greve no setor público não se mostra tão
distinta da greve no setor privado, especialmente quando esta acontece nos
chamados serviços essenciais, já que ambas ameaçam a continuidade da prestação de serviços inadiáveis
à comunidade, não se justificando um tratamento essencialmente distinto em situações análogas (permissão em
um; proibição ou grave restrição em outro).
De fato, alguns pontos
merecem alguma
ponderação.
Em primeiro lugar,em relação à
competência, tratando expressamente a decisão do STF de conflitos entre
Administração e servidores estatutários, parece claro que a competência em relação
aos servidores celetistas seja a da Justiça do Trabalho. Porém, mesmo em
relação aos estatutários, há de se analisar criticamente a posição do STF, pois
afasta a competência da Justiça especializada justamente na solução de
conflitos coletivos de trabalho.
Antonio Álvares da Silva afirma,
inclusive, que “No Direito Coletivo, as
partes são os sindicatos (art. 8º, VI da CF ou, no máximo sindicato e
empresa(s) e o objeto do conflito não é o direito posto, mas o direito a ser
criado. Não é o "ius factum" mas o "ius condendum", o
direito a ser constituído. Há,
pois, fundamental diferença que importa em metodologia própria dos dois ramos
do Direito do Trabalho, que são estudados autonomamente pela doutrina e
expostos distintamente nos livros e manuais. São profundamente diferentes os
dissídios para reivindicar um direito subjetivo garantido por lei e dissídios
que visam criar a própria lei.”[47]
De outra parte, a decisão do STF sinaliza
para uma posição algo rígida em uma aproximação pouco justificada entre
“serviços essenciais” e serviço público. Se parece correto que os conceitos da
lei de greve do setor privada são insuficientes para abarcar as
particularidades do setor público, a definição de que “todo serviço público é
essencial” (especialmente contida no voto do Ministro Joaquim Barbosa) parece
excessiva em face ao recomendado pela Organização Internacional do Trabalho.
Quanto aos serviços mínimos de
funcionamento, deixou o STF de indicar mais claramente as formas de fixação dos
mesmos, que, do ponto de vista das normas internacionais – e da própria
legislação brasileira -, devem ser objeto de negociação prévia da qual
participem os próprios trabalhadores. Conforme a OIT, na fixação desse serviço
mínimo, dever-se-ia atender, pelo menos duas condições: a) deve fixar, real e exclusivamente, um serviço mínimo , quer dizer, um serviço limitado
às atividades estritamente necessárias para cobrir as necessidades básicas da
população ou satisfazer as exigências mínimas do serviço, sem menoscabar a
eficácia dos meios de pressão; b) dado que este sistema limita um dos meios de
pressão essenciais de que dispõem os trabalhadores para defender seus
interesses econômicos e sociais, suas organizações deveria poder participar, se
assim o desejarem, na definição desses serviços mínimos, da mesma forma que os
empregadores e as autoridades públicas”. Diz, ainda, da “suma conveniência” de
que as negociações sobre a definição e a organização do serviço mínimonão se
celebre durante os conflitos de trabalho, “a fim de que todas as partes
interessadas possam negociar com a perspectiva e a serenidade necessárias”.[48]
Por outro lado, a decisão do STF deixa de
reconhecer que, do ponto de vista da OIT e dos tratados internacionais, toda
restrição ao direito de greve deve ser equilibrada pela adoção concomitante dos
chamados “mecanismos de compensação” ou “garantias compensatórias”, de forma
que “sejam compensadas as restrições impostas
a sua liberdade de ação durante os conflitos que possam surgir“.[49]
Um dos mecanismos compensatórios mais
importante é justamente o da adoção de “procedimentos de conciliação e
arbitragem adequados, imparciais e rápidos em que os interessados possam
participar em todas as etapas e que em que os laudos ditados sejam aplicados
por completo e rapidamente” [50] No caso brasileiro, onde
a “judicialização” do conflito coletivo é tradicional, certamente a revisão do
entendimento do STF quanto à possibilidade de ajuizamento de dissídio coletivo
pelos sindicatos de servidores públicos representaria um passo extremamente
relevante, especialmente para as categorias de trabalhadores públicos em
serviços essenciais. Como bem diz Oscar Ermida Uriarte, “tal vez em este
terreno, el arbitraje obligatorio que, de regla, resulta incompatible com el
derecho de huelga, podría significar uma garantia sustitutiva para los
trabajadores, siempre que fuera rápido, participativo y de acatamiento
verdaderamente obligatorio para ambas partes em conflicto, aun cuando una de
estas sea el Estado”.[51]
No entender da OIT, não há falar em
impossibilidade de negociação pela vinculação do Administrador ao orçamento
aprovado pelo Legislativo, uma vez que, no entender de sua Comissão de Perito
sobre Liberdade Sindical, tal fato “não tem como conseqüência impedir a
aplicação de um laudo ditado por um tribunal de arbitragem obrigatório”[52]. Tanto é assim que, na prática, a negociação
já ocorre entre Administração e grevistas, de forma informal ou “à brasileira”,
no dizer do ex-Ministro do TST José Luciano Castilho Pereira.[53]
Como bem lembra o voto do Ministro Marco
Aurélio, “a negociação coletiva tem abrangência que extrapola a simples
concessão de direitos, e exclui a de benesses. Pode mostrar-se como meio
hábil até mesmo ao encaminhamento de
projeto de lei contendo as condições de trabalho almejadas (...) impossível é
deixar de admitir que a negociação coletiva pode visar ao afastamento do
impasse, do conflito seguido de greve, mediante a iniciativa, exclusiva do
Executivo, de encaminhar projeto objetivando a transformação de lei do que
acordado na mesa de negociações. (...) Nem mesmo o Estado, do qual é esperado
procedimento exemplar, pode prescindir desse instrumento viabilizador da paz
social é a negociação coletiva, no qual, para a busco do entendimento global,
geralmente, coloca em plano secundário interesses isolados e momentâneos”.
Em outro estudo, lembramos Pinho
Pedreira, ao comentar a situação da Inglaterra, França com possibilidade de
modificações na remuneração, Suécia, EUA com "alguma forma de
negociação" prevista na legislação de 39 Estados em 1981, Japão, Itália,
Alemanha com "consulta oficial antes da intervenção legislativa",
Espanha, Venezuela, Peru com negociação "desde que não relacionados com
salários" e Argélia. Entre nós, existiria, no mínimo, a situação prevista
na Constituição Federal, quanto ao artigo 39, § 2º, e o artigo 7º, incisos VI e
VII, relativos à negociação sobre redução salarial e duração do trabalho. No específico da previsão orçamentária,
Washington Luiz da Trindade concluiu que se "... os gastos do Estado
dependem de autorização legal e reclamam controle do Parlamento. O argumento
não chega a convencer, porque os gastos da empresa privada são muito mais
fiscalizados com a figura do manager e dos auditores que os gastos do
Estado." [54] No dizer do mesmo
ex-Presidente do TRT da Bahia, “intransponível” mesmo é a realidade da presença
expressiva do Estado-empregador.
[1]
“Nenhum Estado é indiferente (...) mesmo à greve
tipicamente econômica, porque a produção é fundamental para a própria sobrevivência
do Estado, seja ele qual for" (GENRO, Tarso. "Contribuição à Crítica
do Direito Coletivo do Trabalho", LTr, São Paulo, 1999, p. 44).
[2]
Citado em TEODORO, Maria Cecília Máximo e SILVA,
Aarão M. “A imprescindibilidade da
negociação coletiva nas demissões em massa e a limitação de contéudo
constitucionalmente imposta”, disponível em http://jusvi.com/artigos/39249/2,
acessado em 01/12/2009.
[3]
FRANCO FILHO, Georgenor de Souza. “Liberdade
Sindical e Direito de Greve no Direito Comparado”. LTr, São Paulo, 1992, p. 75
[4]
Ao passo que um setor doutrinal prognosticava
um”lassez-faire” do Estado, outro, em oposição, não acreditava em um livre jogo
de “forças compensadoras” que, por si só, alcançasse um ponto de equilíbrio
automático. Para estes, o Estado era necessário “para regular os fenômenos
coletivos em determinadas condições, estimulando e apoiando o exercício da
autonomia coletiva e de suas diversas manifestações, na linha de uma legislação de sustento à italiana”
(BAYLOS, Antonio. “Derecho del Trabajo:
modelo para armar”. Ed.Trotta, Madrid, 1991, p. 110).
[5]
Ob. cit., p. 109.
[6]
A respeito da gradativa passagem do estágio de
repressão para o de reconhecimento da autonomia coletiva, ver JACOBS, Antoine. “La autonomia colectiva” in BOB, HEPPLE. “La
formación del Derecho del Trabajo en Europa”, MTSS, Madrid, 1986, pp.239-93.
[7]
Conforme Godinho Delgado: ”Destituir os
trabalhadores das potencialidades de tal instrumento é tornar falacioso
princípio juscoletivo da equivalência
entre os contratantes coletivos, em vista da magnitude dos instrumentos de
pressão coletiva naturalmente detidos pelos empregadores” (GODINHO DELGADO,
Maurício. “Direito Coletivo do Trabalho”, LTr, São Paulo, 2001, p. 143
[8]
“O Direito Coletivo do Trabalho cumpre função
social e política de grande importância. Ele é um dos mais relevantes
instrumentos de democratização do poder, no âmbito social, existente nas
modernas sociedades democráticas”. (DELGADO, Maurício Godinho. “Curso de Direito
do Trabalho”, LTr, São Paulo,2002, p. 1268).
[9]
LOPEZ, Gerardo Valente Perez. "La Huelga en el
sistema jurídico mexicano. Sus perspectivas en la cultura laboral del siglo
XXI",. Cidade do México, Ed. Sista, 2007, p. 97
[10]
FAJESTEIN, Fany. “A causa da greve. Um problema
de epistemologia jurídica” in “Democracia e Direito do Trabalho”. VARGAS, Luiz
Alberto (coord), São Paulo, LTr,, 1995, p. 117.
[11]
URIARTE, Oscar Ermida. “La huelga y la solución de los conflictos colectivos
en los servicios esenciales” in AAVV, “El derecho de huelga. Nuevas
experiencias en América Latina Y Europa”, Fundación Friedrich Ebert en
Argentina, Editorial Nueva Sociedad, 1990, Venuzuela, p. 116.
[12]
“A greve – movimento de defesa de uma
coletividade – é, no fundo um fenômeno de
força, inerente à existência na sociedade de interesses coletivos poderosos
e organizados” (MARANHÃO, Délio e CARVALHO, Luiz
Inácio. “Direito do Trabalho”, Ed. FGV, São Paulo, p. 368).
[13]
“Sem dúvida alguma, a greve constitui um direito
fundamental, ainda que não um fim em si mesmo” (OIT, “Libertad Sindical y
negociación colectiva”, Oficina Internacional del Trabajo, Genebra, 1994, verbete 136).
[14]
Hector-Hugo Barbaagelata foi o palestrante de abertura em evento da AMATRA, realizado em
Montevidéu, no ano de 2008. É autor
de “Particularismo do Direito do Trabalho, traduzido para o português pela
Editora LTr, 1996. Mais recentemente, em março de 2009, escreveu um acréscimo
ao mesmo livro, sob o título “Reconsideración del tema del particularismo del
Derecho del Trabajo".
[15]
OIT, “La Libertad Sindical.
Recompilación de decisiones e princípios del Comité de Libertad Sindical del
Consejo de Administración de la OIT”, Genebra, 2006, 5ª. edição revisada, p. 13
[16]
SIQUEIRA, José Francisco. “Liberdade Sindical no
Mercosul e Chile”. - [Electronic ed.]. - São Paulo, 1999. FES Library, 2000, in http://library.fes.de/fulltext/bueros/saopaulo/00658toc.htm, acessado em 01/12/2009.
[17]
Em outro texto, tratamos dos “piquetes”, VARGAS,
Luiz Alberto e FRAGA, Ricardo, “Aspectos dos
Direitos Sociais”, São Paulo: LTr, 1989.
[18] VARGAS, Luiz Alberto e FRAGA, Ricardo. “Relações Coletivas e Sindicais - novas
competências após a EC-45”, Porto Alegre, Revista do TRT 4a. Região, dezembro/2005.
[19]
Sobre a exata finalidade das multas,
recorde-se GONZALES, Carmen, “Direito de Greve”, jornal Zero Hora, coluna
Opinião, maio de 1996.
[20]
Sobre o tema, recorde-se BELTRAN, Ari
Posidonio. “A Autotutela nas Relações de Trabalho”, São Paulo: LTr, 1996.
[21]
PANKERT, Alfred, 1981,
“Solución de conflictos del trabajo en los servicios esenciales” in Revista
Internacional del Trabajo, T. XXI, n. 110, Montevideo)” citado por URIARTE, Oscar Ermida. ob. cit.,
p. 115.
[22]
OIT, “La Libertad Sindical. Recompilación de decisiones y principios de
Comité de Libertad Sindical del Consejo de Administración de la OIT,5ª. Edición revisada, Oficina
Internacional de la OIT, Ginebra, 2006. Disponível em http://www.ilo.org/ilolex/gbs/ceacr2009.htm. Acessado em 01/12/2009.
[23]
OIT, 2006, ob.cit., verbetes 606-25.
[24]
A doutrina tradicional, a partir das quais o Direito Administrativo Brasileiro
se desenvolveu, estão baseadas na teoria do "ato-condição" de Leon
Duguit, juspublicista francês, como lembra Francisco Rossal de Araújo, citando
Celso Antônio Bandeira de Mello, para o qual "o funcionários se encontra
debaixo de uma situação legal, estatutária, que não é produzida mediante um
acordo de vontades, mas imposta unilateralmente pelo Estado, e, por isso mesmo,
suscetível de ser, a qualquer tempo, alterada por ele sem que o funcionário
possa se opor..." (ARAÚJO, Francisco Rossal. "A Relação de Trabalho na Administração Pública", Revista do TRT 4ª Região. Porto Alegre,1992, n. 25, p.. 44.
[25]
Carlos Simões ("Direitos dos Servidores no
Regime Jurídico Único e Desenvolvimento da Bilateralidade na Constituição
Federal, Revista LTr, 55-04/413 citado em MACHADO, Pedro Maurício.
"Sevidores Públicos Federais. Regime Jurídico Único. Competência da
Justiça do Trabalho", Caderno Especial da Fenastra, Feder,0ação Nacional das Associações e Sindicatos dos
Servidores da Justiça do Trabalho, 1991, Florianópolis, p. 7.
[26]
“Passando (o Estado) a competir no campo na
forma de empresas ou patrimônios explorados pelo poder público, seja ele mesmo,
diretamente, como gestor de mão-de-obra que o serve, viu-se gradual e
sucessivamente movendo-se em círculos concêntricos, enredado nas teias da
legislação trabalhista” (VILHENA, Paulo Emílio R., “Contrato de Trabalho com o Estado”, LTr, São
Paulo, 2002, p. 14)
[27]
COELHO, Rogério Viola. "A Relação de Trabalho com o Estado". Ed. LTr,
São Paulo, 1994, p. 70.
[28] Quanto a determinadas categoriais, ditas sensíveis
(militares, funcionários de alto escalão),a OIT entende justificável
a existência de restrições aos direitos de direito
de sindicalização e de greve.
[29] Comentamos o
tema e o veto do Presidente José Sarnei, “derrubado” no Congresso Nacional, em “Direitos e Sonhos –
além dos limites do orçamento”, in “Direito e Castelos”, Ricardo Carvalho
Fraga, São Paulo: LTr, 2002, p. 9.
[30]
“Para ser o resultado de uma negociação coletiva
exigível juridicamente, deve ser transformada em ato administrativo válido,
exarado por autoridade competente (...) sobre restrições, também, do
entendimento cultural doutrinário e jurisprudencial dominante no sentido que a
unilateralidade do estabelecimento das condições de trabalho no setor público,
pelo Administrador, seria de natureza ontológica do mesmo” (BELFORT,Fernando.
“Apontamentos de Direito Coletivo”, São Luís Lithograf, 2005, p. 81).
[31]
Desconhece-se, assim, a natureza instrumental do direito à sindicalização
e do direito de greve - institutos que pressupõem o reconhecimento, pelo
direito, da existência de conflitos coletivos de interesses e que se destinam à
viabilização da negociação coletiva, aceita universalmente como a forma mais
elevada para solucioná-los” (COELHO, ob.cit., p. 30).
[32]
BELFORT, ob. cit. p. 82.
[33]
Mandado de Segurança n.2000.34.00.018227-1, impetrado: Confederaçao Nacional
dos Trabalhadores em Seguridade Social- CNTSS e outros; impetrado: Coordenador
de Recursos Humanos do Ministério do Orçamento e Gestão, Oitava Vara da Seção
Judiciária do Distrito Federal, Juiz Márcio Barbosa Maia.
[34]
*"Se faltam parâmetros para o exercício do
direito de greve, falta que não se pode creditar ao universo dos servidores,
cabia à Administração, primeiro, obter a declaração de ilegalidade, na sede e
foro próprios, para só então, aplicar as sanções cabíveis" (Mandado de
Segurança n. 2000.19402-6, impetrante Federação Nacional dos Sindicatos de
Trabalhadores em Saúde e Previdência Social - Fenasps e impetrado Coordenador
de Recursos Humanos do Ministério do Orçamento e Gestão - MOG e outros, Nona
Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal, Juiz Antonio Correa.
[35] A respeito do assunto a
reportagem “ por Marcos Cézari, “Falta de lei emperra greve no serviço
público”, Correio Sindical Mercosul,
31/7/2005, acessado em 01/12/2009, disponível em http://www.sindicatomercosul.com.br/noticia02.asp?noticia=25548.
[36]
Um dos primeiros, o Projeto de Lei Complementar, n.
56 de 1989, de autoria do Deputado Ruy Nedel.
[37]
Por força da Emenda Constitucional n. 19/1998, o
artigo 37, VII foi alterado, passando a não mais exigir regulamentação do
direito de greve por lei complementar, mas apenas por lei ordinária.
[38]
MI 670, Rel. Gilmar Mendes, impetrante: Sindicato dos Servidores Policiais Civis do Estado do Espírito Santo – Sindpol; Impetrado: Congresso
Nacional.
MI 708, Rel. Gilmar Mendes, Impetrante: Sintem -
Sindicato dos Trabalhadores em Educação do
Município de João Pessoa; Impetrado: Congresso Nacional.
MI 712,Rel. Eros Grau. Impetrante: Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário do Estado do Pará – Sinjep. Impetrado; Congresso Nacional.
Data de
Julgamento: 25/10/2007.
[39]
Tal solução já havia sido preconizada pelo Ministro
Marco Aurélio Mendes de Farias Mello, já por ocasião do Mandado de Injunção n.
20, no julgamneto ocorrido em 19/5/1994. Da mesma forma, o Ministro Carlos
Velloso, no MI n. 631 (Rel.Ilmar Galvão, DJ 02/8/2002).
[40]
"Evidentemente, não se outorga ao legislador
qualquer poder discricionário quanto à edição ou não de lei disciplinadora do
direito de greve. O legislador poderá adotar um modelo mais ou menos rigido,
mais ou menos restritivo do direito de greve no âmbito do serviço público, mas
não poderá deixar de reconhecer o direito previamente definido na
Constituição" (voto do Ministro Gilmar Mendes).
[41]
Significativo, no voto condutor do Ministro Gilmar
Mendes: "Mencione-se, a propósito, episódios mais recentes relativos à
paralisação dos controladores de vôo do país; ou, ainda, no caso da greve dos
servidores do Judiciário do Estado de São Paulo, ou dos peritos do Instituto
Nacional de Seguridade Social (INSS), que trouxeram prejuízos irreparáveis a
parcela significativa da população dependente desses serviços públicos. A
não-regulação do direito de greve acabou por propiciar um quadro de selvageria
com sérias consequências para o Estado de Direito".
[42]
“Pela complexidade e variedade dos serviços
públicos e atividades estratégicas típicas de Estado, há outros serviços
públicos, cuja essencialidade não está contemplada pelo rol dos arts. 9º a 11
da Lei nº 7.783/1989. Para fins desta decisão, a enunciação do regime fixado
pelos art. 9º a 11 da Lei n. 7.783/1989 é apenas exemplificativa (“numerus apertus”)”. (Voto
do Ministro Gilmar Mendes).
[43]
A esse respeito, ver Robert Alexy, “Teoría de los Derechos Fundamentales”,
Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2001, p. 112.
[44]
Em relação aos serviços de saúde, reconhecendo que,
atualmente, em alguns locais, o funcionamento "regular e pleno de tais
serviços já não atende ao mínimo exigido para assegurar o direito à vida",
o voto do Ministro chega a admitir que, "como consequencia dessa
orientação, a possibilidade de vierem a ser inviáveis, por exemplo, greves que
resultem em paralisação ou redução dos mesmos”.
[45]
Citam-se, expressamente, os anteprojetos de lei
n. 4497/2001 (dep. Rita Camata), n. 5662/2001 (dep. Airton Cascavel), n.
6032/2002 (de autoria do Executivo), n. 6.141/2002 (dep. Iara Bernardi), n.
6668/2002 (dep. Elcione Barbalho), n. 6775/2002(oriundo da Comissão de
Legislação Participativa), n. 1950/2003 (dep. Eduardo Paes), n. 4497/2001 (dep.
Francisco Rodrigues)
[46]
Em sentido diverso, é de se notar que, em muitos dos anteprojetos já
referidos, os dias de greve são contados como de efetivo exercício, inclusive
remuneratório, desde que, encerrada a greve, as horas não trabalhadas sejam repostas
de acordo com cronograma estabelecido conjuntamente pela Administração e pelos
servidores;
[47]
SILVA, Antonio Álvares da. “Servidor
Público Competência da
Justiça do Trabalho para o Julgamento de
Conflitos Coletivos de
Trabalho dos Servidores Públicos” acessado em 1/12/2009. Disponível em
http://www.revistas.unifacs.br/index.php/redu/article/view/442.
[48]
OIT, 1994, verbete 161.
[49]
OIT, 2006, verbete 595.
[50]
OIT, 2005, verbete 596.
[51]
URIARTE, Oscar Ermida.ob. cit. p. 128
[52]
OIT, 2005, verbete 597.
[53]
Citado em FERREIRA, Duvanier Paiva e outros.
“Negociação Coletiva de Trabalho no Serviço Público Brasileiro”, acessado em
01/12/2009. disponível em http://www.slideshare.net/CharlesMoura/negociao-coletiva-de-trabalho-no-servio-pblico.
[54]
Ricardo Carvalho Fraga, “Direitos
e Sonhos – além dos limites do orçamento”, in “Direito e Castelos”, Ricardo
Carvalho Fraga, São Paulo: LTr, 2002, p. 10.
[i] Os autores são Desembargadores do Trabalho do Tribunal Regional do
Trabalho da Quarta Região, Rio Grande do Sul, com sede em Porto Alegre.